COVID e Hemoterapia

por | out 22, 2021

Com o surgimento da pandemia do coronavírus em 2019/2020 era esperado que a atividade hemoterápica tivesse impacto e consequentemente necessidade de se adaptar. Muitos questionamentos foram levantados: haveria alguma demanda específica de algum hemocomponente? Como seria realizado a triagem de doadores? Qual seria a forma mais segura para coletar sangue dos doadores sem expô-los ao risco infeccioso, se haveria estoque de hemocomponente suficiente para abastecer os hospitais. Nesse blog iremos escrever sobre a assistência hemoterápica no Brasil durante esses quase 2 anos de pandemia.

 

O estoque de sangue dos hemocentros e dos serviços de hemoterapia reduziram no período crítico de pandemia, não devido um alto consumo, pelo contrário, houve cancelamento das cirurgias e procedimentos eletivos reduzindo a demanda por sangue, no entanto o número de doadores reduziu drasticamente. Acreditava-se que os doadores estavam receosos de sair de casa, mantendo o isolamento social, ou possuía medo de se infectarem no trajeto ou no próprio local de coleta ou até mesmo por estarem infectados. Os serviços de hemoterapia responsáveis por coleta de sangue se organizaram para receberem os doadores com segurança: agendamento de doadores para evitar aglomeração, espaçamento dos acentos destinado aos doadores, aumentaram, coletas externas foram programadas e reforçaram a higienização dos ambientes e dos usuários.

 

O Ministério da Saúde recomendou que houvesse uma inaptidão temporária dos candidatos à doação de sangue que foram infectados pelos vírus SARS-­CoV-­2, após diagnóstico clínico e/ou laboratorial deverão ser considerados inaptos por um período de 30 dias após a completa recuperação. Os candidatos à doação de sangue que tiveram contato, nos últimos 30 dias, com pessoas que apresentaram diagnóstico clínico e/ou laboratorial de infecções pelo vírus SARS­CoV­2 deverão ser considerados inaptos pelo período de 14 dias após o último contato com essas pessoas. Os candidatos à doação de sangue que permaneceram em isolamento voluntário ou indicado por equipe médica devido a sintomas de possível infecção pelo SARS­CoV­2 deverão ser considerados inaptos pelo período que durar o isolamento (no mínimo 14 dias) se estiverem assintomáticos.

 

A vacinação da população levou uma redução sustentada dos casos de COVID, diminuído a inaptidão por doença e relaxamento das medidas restritivas de isolamento social. Mas a vacinação também, impôs algumas inaptidões temporárias como pode ser visualizado na tabela abaixo:

 

Tabela: inaptidão temporária para doação de sangue de candidatos que foram submetidos a vacinação contra a Covid-194.

 

A Infecção de SAR-COV-2 por transfusão de sangue não foi descrita até então, não há testes laboratoriais específicos para o vírus na triagem dos doadores, mas os doadores são avaliados clinicamente durante a Triagem Clínica quando são questionados se possuem sinais e/ou sintomas de infecção respiratória atual, além dos critérios de inaptidão citado acima. Apesar de não ter evidência de viremia detectada no sangue de indivíduos infectados é possível que exista, então os doadores que manifestarem sintomas de COVID até 14 dias pós doação de sangue deverão comunicar os sinais e/ou sintomas para o serviço de hemoterapia que realizou a coleta, para que os componentes dessa doação sejam rastreados e descartados. Caso algum componente tenha sido transfundido é necessário o acompanhamento clínico do receptor. Apenas os hemocomponentes que foram submetidos a técnica de inativação de patógenos podem ser considerados sem risco, porém só essa técnica só é utilizada nos componentes de plaquetas e plasma, em poucos serviços no país.

 

Alguns pacientes infectados por SAR-COV-2 evoluíram clinicamente com citopenias, como anemia hemolítica, trombocitopenia imune e podem necessitar de um suporte transfusional mais específico. No entanto, a grande maioria dos pacientes não possuem uma demanda especial de transfusão. Porém mesmo utilizando um padrão restritivo de indicação de transfusão, 20% dos pacientes graves, em terapia intensiva, necessitaram de uma ou mais transfusões de concentrado de hemácia, 3% necessitaram de transfusão de plaquetas e 2% necessitaram de plasma fresco congelado ou crioprecipitado. O maior consumo de hemocomponentes foram descritos nos pacientes que necessitaram de oxigenação por membrana extracorpórea (extracorporeal membrane oxygenation-ECMO) 50%, em comparação com 14% sem ECMO.

 

No início da pandemia acreditava-se que o uso de plasma de convalescente dos pacientes que tiveram COVID e se recuperaram poderia ser útil no tratamento da infecção de paciente graves, sendo liberado pelo Ministério da Saúde o uso de forma compassiva6. Após vários trabalhos publicados utilizando essa terapia, o benefício foi comprovado apenas quando utilizado em pacientes de risco para adquirir a forma grave da doença (imunossuprimido, idosos, e portadores de comorbidades), usado precocemente e com altos títulos de anticorpos neutralizante2. No Brasil, a recomendação é que o plasma de convalescente de COVID seja utilizado apenas em protocolos clínicos e se o uso experimental do plasma convalescente, sob responsabilidade médica, deve seguir os requisitos de Boas Práticas de Serviços de Saúde e de Segurança do Paciente, sendo os resultados devidamente documentados para que possam ser usados em futuros estudos científicos.

 

Infelizmente a pandemia não acabou, mas por enquanto são essas as informações disponíveis na literatura e no Ministério da saúde sobre COVID e hemoterapia.

 

Até a próxima.

 

Equipe Erytro.

 

Bibliografia consultada:

 

1. Flegel WA. COVID-19 insights from transfusion medicine. Br J Haematol. 2020 Sep;190(5):715-717. doi: 10.1111/bjh.17005. Epub 2020 Jul 28. PMID: 32640485; PMCID: PMC7361384.

2. De Santis, G. C., Mendrone, A., Langhi, D., Covas, D. T., Fabron, A., Cortez, A. J. P., … Rugani, M. A. (2021). Suggested guidelines for convalescent plasma therapy for the treatment of COVID-19. Hematology, Transfusion and Cell Therapy, 43(2), 212–213. doi:10.1016/j.htct.2021.03.00

3. NOTA TÉCNICA Nº 5/2020-CGSH/DAET/SAES/MS 1. ASSUNTO Atualização dos critérios técnicos para triagem clínica de dengue (DENV), chikungunya (CHIKV), zika (ZIKV) e coronavírus (SARS, MERS, 2019-nCoV) nos candidatos à doação de sangue.

4. NOTA TÉCNICA Nº 13/2020­CGSH/DAET/SAES/MS. Atualização dos critérios técnicos contidos na NOTA TÉCNICA Nº 5/2020­CGSH/DAET/SAES/MS para triagem clínica dos candidatos à doação de sangue relacionados ao risco de infecção pelo SARS­CoV­2

5. NOTA TÉCNICA Nº 12/2021/SEI/GSTCO/DIRE1/ANVISA Orientação sobre inaptidão temporária para doação de sangue de candidatos que foram submetidos a vacinação contra a Covid-19 e outras recomendações.

6. NOTA TÉCNICA Nº 10/2020/SEI/GHBIO/GGMON/DIRE5/ANVISA Aspectos de hemovigilância relacionados ao uso de plasma convalescente para tratamento da COVID-19.

7. NOTA TÉCNICA Nº 33/2021/SEI/GSTCO/DIRE1/ANVISA. Atualização das recomendações sobre o uso de plasma de doador convalescente para o tratamento da Covid-19 e a doação deste po de plasma por indivíduos vacinados contra a Covid-19

Inativação de patógenos

O tema do nosso conteúdo livre de hoje é: Inativação de patógenos.

Lavagem de Hemocomponentes

O tema do nosso conteúdo livre de hoje é: Lavagem de hemocomponentes

Existe plaqueta de uso universal?

O tema do nosso conteúdo livre de hoje é: Existe plaqueta de uso universal?