Manejo hemoterápico em catástrofes

por | dez 20, 2022

Catástrofes são definidas como incidentes com várias vítimas que necessitam de atendimento simultaneamente e que ameaçam sobrecarregar os recursos de saúde disponíveis, independentemente do número ou volume específico de pacientes.

 

Planejar a necessidade de transfusão de hemocomponentes para atendimento a várias vítimas simultâneas é uma tarefa crítica tanto para o serviço de transfusão do hospital de referência quanto para o hemocentro fornecedor. Nas cidades há uma central regulatória de catástrofes, normalmente vinculada à prefeitura e ao Estado, que coordena esse tipo de atendimento. Nos Estados Unidos essa central é chamada de Task Force e desde 2002 coordena o atendimento hemoterápico dos desastres naturais ou causados pelo homem, em especial, das ações terroristas. Essa central é responsável por informar aos serviços de hemoterapia e ao hemocentro fornecedor o tipo do evento, o número de pessoas envolvidas e quais serão os hospitais de referências e os de apoio.

 

O hospital referência para o atendimento da catástrofe deve estar preparado o evento, pois a rotina de atendimento é significativamente alterada. Em um protocolo transfusional de catástrofes é preconizada a organização do fluxo atendimento das vítimas que irão necessitar de transfusão (aproximadamente 25% das admissões). Do ponto de vista hemoterápico, as vítimas são classificadas em 3 categorias: P1- paciente muito grave com risco de transfusão maciça; P2- paciente ferido que precisará de alguma transfusão; P3- paciente que a princípio não possui necessidade de transfusão. Os pacientes das categorias P1 e P2 devem receber identificação provisória previamente preparada em pulseira e nos tubos de amostras a serem coletadas e direcionadas para a agência transfusional e para o laboratório de análises clínicas. Essa identificação provisória funcionará como o registro hospitalar inicial da vítima.

 

A estimativa aproximada de consumo de hemocomponentes por admissão de paciente é de 6 unidades de hemácias, 4 de plasma e 0,5 dose de plaquetas (POOL ou aférese) em serviços especializados em trauma e de 3 hemácias, 1 plasma e 0,25 dose de plaquetas, em atendimentos realizados em hospitais gerais. Esses hemocomponentes serão dispensados conforme o protocolo de atendimento à catástrofe previamente elaborado pela equipe da hemoterapia e aprovado pelo comitê transfusional do hospital. Este protocolo deve englobar a transfusão maciça e a transfusão de emergência, incluindo as realizadas sem a finalização dos testes pré-transfusionais.

 

O maior número de transfusões ocorre no dia do evento. No dia subsequente ,o quantitativo de hemácias, plasma e plaquetas cai para de 50%, 30% e 15%, respectivamente, em relação ao consumo do primeiro dia. Idealmente, os serviços de hemoterapia e o hemocentro fornecedor devem organizar seu estoque, acrescentando uma taxa de emergência (deve corresponder ao mínimo necessário para o atendimento a uma catástrofe) e uma rede de apoio para direcionamento dos hemocomponentes já liberados e distribuídos para o hospital de referência no dia do evento, em especial, dos concentrados de hemácias do grupo O.

 

Em catástrofes há uma grande comoção da população para doar sangue, com consequente procura em massa de potenciais doadores aos hemocentros ou locais em que realizam coletas de sangue próximas ao evento. Esses locais devem organizar os suprimentos e os funcionários para atender este número excepcional de pessoas. As coletas de sangue total devem ser direcionadas para doadores do grupo O. Os demais doadores devem ser encaminhados para coletas específicas, como, por exemplo, de plaquetáferese.

 

As normas Brasileiras de Hemoterapia não permitem o afrouxamento dos quesitos atuais de triagem do doador, seja clínica, sorológica ou por tecnologia de ácido nucleico visto que, os hemocomponentes doados em períodos de catástrofes serão úteis não só para o atendimento das vítimas (que aconteceram normalmente nos primeiros 7 dias do evento), mas também para repor os estoques dos serviços parceiros que direcionaram seus hemocomponentes para o atendimento no dia do evento.

 

Por fim, a mensagem que esse blog gostaria de passar é que para fazer um Manuseio Hemoterápico de qualidade em situações de catástrofes é essencial estar preparado para o evento: manter o estoque sempre atualizado, com o mínimo necessário para atendimento imediato de vítimas simultâneas; possuir protocolo de transfusão maciça e de emergência validados e aprovados pelo comitê transfusional; estabelecer um fluxo de transporte de hemocomponentes com o fornecedor; avaliar os insumos para realização de transporte de hemocomponentes e de testes pré-transfusionais; estabelecer o fluxo de identificação provisória e como as etiquetas serão substituídas pelos registros oficiais dos pacientes. Treine a sua equipe! E sempre que passar por um evento como esse, estude os resultados, avalie todos os procedimentos e proponha melhorias.

 

Esperamos que tenham gostado!

 

Até a próxima.

 

Equipe erytro.

 

Referencias:

Ramsey G. Blood transfusions in mass casualty events: recent trends. Vox Sang. 2020 Jul;115(5):358-366. DOI: 10.1111/vox.12916

 

Ramsey G. Blood component transfusions in mass casualty events. Vox Sang. 2017 Oct;112(7):648-659. DOI: 10.1111/vox.12564

 

Chhibber VG, Fischman J, Benedetto AT, et al. How do I manage O- red blood cell inventory. Transfusion. 2020 Jul;60(7):1356-1363. DOI: 10.1111/trf.15849

 

DISASTER OPERATIONS HANDBOOK AABB. COORDINATING THE NATION’S BLOOD SUPPLY DURING DISASTERS AND BIOLOGICAL EVENTS, 2008. Disponível em: DISASTER (aabb.org) acesso em 10/12/2022

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