Patient Blood Management

por | jul 25, 2023

JUL 25, 2023

O termo Patient Blood Management (PBM) foi usado pela primeira vez em 2005 pelo professor James Isbister, um hematologista australiano, que percebeu que o foco da medicina transfusional deveria ser mudado de “hemocomponentes” para “os pacientes”. O PBM é uma estratégia multifatorial e multidisciplinar centrada no paciente, com o objetivo de minimizar o uso de hemocomponentes e melhorar os resultados dos pacientes. O PBM tem três objetivos principais: 1) identificar e tratar anemias, além de estimular a massa eritrocitária, incluindo tratamentos como agentes estimuladores da eritropoiese e suplementos de ferro e vitaminas; 2) minimizar a perda de sangue em cirurgias e estimular o uso do sangue autólogo; 3) otimizar a tolerância à anemia, promovendo a máxima função pulmonar e cardíaca, para tolerar um limiar transfusional restritivo.

Um dos campos de aplicação mais importantes do PBM é o ambiente perioperatório, pois anemia e transfusão têm sido associadas ao aumento da morbidade e mortalidade em pacientes cirúrgicos. Além disso, a aplicação sistemática de um programa de PBM no período perioperatório melhora consistentemente os resultados clínicos dos pacientes após a cirurgia. Recentemente, os programas de PBM foram estendidos para condições clínicas, incluindo pacientes gravemente enfermos em Unidades de Terapia Intensiva, pacientes com distúrbios hepáticos, com insuficiência cardíaca e obstetrícia.

A anemia é uma condição clínica muito prevalente nos pacientes pré-cirúrgicos e cada vez mais robusta é a evidência que mostra um desfecho desfavorável nos pacientes operados anêmicos. Porém, o valor de hemoglobina considerado seguro para realização de uma cirurgia ainda não é consenso. A grande maioria dos artigos procuram um alvo de hemoglobina acima ou igual a 13 g/dL, indiferente do sexo ou idade. A avaliação clínica do paciente deve ser realizada preferencialmente 4 semanas antes da cirurgia, sendo indicado a avaliação do perfil de ferro, de vitaminas e da função renal. Se identificado anemia deve-se instituir um tratamento e, em algumas situações, está indicado o uso estimulante da eritropoiese (alfa-eritropoetina) para alcançar o alvo de hemoglobina desejável. Na avaliação pré-anestésica também é importante avaliar outras situações, como: risco hemorrágico, uso de medicação, que altera a hemostasia e consequentemente o risco de sangramento, e se está indicado/contraindicado o uso de antifibrinolítico. Como a hemostasia é um equilíbrio de enzimas pró-coagulantes e anticoagulantes, neste momento, também é importante avaliar o risco de trombose, o risco cardiovascular e a tolerabilidade à anemia per e pós-operatória.

A escolha de técnicas cirúrgicas menos cruentas, como videolaparoscópicas e robóticas, devem ser elegíveis, sempre que possível. Realizar revisão hemostática minuciosa, manter o paciente normotérmico e com quantidade adequada de cálcio deve ser rotina em todas as cirurgias para evitar discrasias sanguíneas. O uso de antifibrinolítico mostrou ser seguro e eficaz na redução de sangramento, no uso de hemocomponentes, sem aumento do risco de trombose, devendo, ser uma opção terapêutica. Técnicas de autotransfusão, como: hemodiluição normovolêmica, no qual realiza-se uma coleta do sangue total do paciente enquanto infunde-se cristaloide no pré-operatório imediato e o uso de equipamentos de recuperação celular em grandes cirurgias são opções para redução do uso de sangue alogênico. Esses equipamentos, chamados “cell saver”, coletam o sangue das cavidades com ajuda de uma bomba e, juntamente com heparina, são encaminhados para uma centrífuga. Neste momento, ocorre a lavagem do sangue coletado com soro fisiológico e, em seguida, há uma concentração do sangue coletado até um hematócrito adequado para uma reinfusão imediata no paciente. Outra tecnologia que pode ajudar na redução do uso de hemocomponentes alogênicos é o uso de equipamento de point of care em hemostasia, como os equipamentos de tromboelastometria, que avalia em tempo real o registro gráfico do coágulo, dirigindo o médico para a escolha adequada de medicamentos, de hemoderivados e/ou hemocomponentes de forma específica, assim reduzindo o consumo geral da transfusão de hemocomponentes.

No pós-operatório, é importante manter o paciente com suporte clínico otimizado para que ele tolere melhor graus variados de anemia. A suplementação de sais de ferro associada, ou não, à eritropoetina de curta duração pode ser necessária também nessa etapa. Entretanto, se o paciente estiver sintomático e o único fator determinante para esses sintomas é a anemia (hemoglobina <7-8 g/dL), deve-se fazer uso de transfusão de hemocomponentes para controle clínico.

Todos os serviços de saúde devem implementar o PBM. Comece com que você possui. Mudar a cultura da equipe é o primeiro passo para implantação do programa, além de medidas simples, como não realizar cirurgias eletivas em pacientes anêmicos. Ademais, a incorporação de sais de ferro venosos e eritropoetina para o programa é aconselhada, pois são medicamentos de baixo custo já disponíveis na rede pública brasileira em outros programas de saúde; a otimização das coletas de sangue para análises clínicas que muitas vezes são desnecessárias em pacientes com longa internação; a realização de auditoria nas solicitações de hemotransfusões para avaliar se os critérios restritivos de transfusão estão sendo respeitados. Sendo assim, a exemplo da Austrália, que nos mostrou que ao longo dos anos o PBM levou a uma redução financeira dos custos de produção de hemocomponentes e de internação hospitalar, além do benefício ao paciente.

Por hoje é só, espero que tenha gostado.

 

Até a próxima!

 

Equipe Erytro

 

Bibliografia:

 
 

1. Franchini M, Marano G, Veropalumbo E, Masiello F, Pati I, Candura F, Profili S, Catalano L, Piccinini V, Pupella S, Vaglio S, Liumbruno GM. Patient Blood Management: a revolutionary approach to transfusion medicine. Blood Transfus. 2019 May;17(3):191-195. doi: 10.2450/2019.0109-19.

2. Huang J, Firestone S, Moffatt-Bruce S, Tibi P, Shore-Lesserson L. 2021 Clinical Practice Guidelines for Anesthesiologists on Patient Blood Management in Cardiac Surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2021 Dec;35(12):3493-3495. doi: 10.1053/j.jvca.2021.09.032. Epub 2021 Sep 24. PMID: 34654633.

3. Task Force on Patient Blood Management for Adult Cardiac Surgery of the European Association for Cardio-Thoracic Surgery (EACTS) and the European Association of Cardiothoracic Anaesthesiology (EACTA); Boer C, Meesters MI, Milojevic M, Benedetto U, Bolliger D, von Heymann C, Jeppsson A, Koster A, Osnabrugge RL, Ranucci M, Ravn HB, Vonk ABA, Wahba A, Pagano D. 2017 EACTS/EACTA Guidelines on patient blood management for adult cardiac surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2018 Feb;32(1):88-120. doi: 10.1053/j.jvca.2017.06.026. Epub 2017 Sep 30. PMID: 29029990.

4. Murtha-Lemekhova A, Fuchs J, Ritscher E, Hoffmann K. Effect of Autotransfusion in HCC Surgery on Survival and Recurrence: A Systematic Review and Meta-Analysis. Cancers (Basel). 2022 Oct 3;14(19):4837. doi: 10.3390/cancers14194837. PMID: 36230760; PMCID: PMC9564172.

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